Por entender estar configurado “flagrante constrangimento ilegal”, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), revogou a prisão preventiva do ex-ministro Paulo Bernardo Silva. O relator indeferiu liminar na Reclamação (RCL) 24506, na qual o ex-ministro alega usurpação da competência da Corte pelo juízo federal em São Paulo que decretou sua prisão, mas concedeu habeas corpus de ofício por verificar flagrante ilegalidade na segregação cautelar.
No STF, a defesa sustenta que a investigação sobre as condutas atribuídas a Paulo Bernardo envolvem fatos pelos quais sua esposa, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), responde a inquérito perante o Supremo. “A investigação na primeira instância implica em ofensa à regra do juízo natural, em face de nítida continência atribuída à conduta de investigados e de detentor de foro de prerrogativa”, sustenta. Assim, seus advogados pediram a concessão de liminar para afastar a segregação cautelar por entender que seu cliente se encontra preso “por ordem de uma autoridade manifestamente incompetente”.
Decisão
Inicialmente, o ministro Dias Toffoli indeferiu o pedido de liminar ao entender que não ficou demostrada, em análise preliminar do caso, situação de violação da competência do STF. Para o relator, a alegada relação entre os fatos não justifica, à primeira vista, o trâmite do processo perante o STF. Ele explicou que o Plenário, no julgamento de questão de ordem no Inquérito (INQ) 4130, de sua relatoria, determinou a cisão do processo em relação a todos os investigados não detentores da prerrogativa de foro, estabelecendo que a investigação prossiga no Supremo somente em relação à senadora da Gleisi Hoffmann.
Contudo, ao analisar os fundamentos do decreto de prisão, o ministro verificou situação de flagrante ilegalidade. Ele explicou que os juízes e os tribunais têm competência para expedir, de ofício, ordem de habeas corpus quando, no curso de processo, verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal (artigo 654, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal). Salientou que o STF admite, em sede de reclamação constitucional, a implementação de habeas corpus de ofício no intuito de reparar situações de flagrante ilegalidade devidamente demonstradas.
Em sua decisão, o ministro Toffoli assinalou que a decretação da prisão preventiva do ex-ministro contrasta com o entendimento consolidado pelo Supremo a respeito dos requisitos da prisão cautelar. O relator destacou que fundamento do juízo de primeira instância, no sentido de que não foi localizado o produto do crime, não constitui elemento idôneo para a decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública, uma vez que tal situação se relaciona ao juízo de reprovabilidade da conduta, próprio do mérito da ação penal. “A prisão preventiva não pode ser utilizada como instrumento para compelir o imputado a restituir valores ilicitamente auferidos ou a reparar o dano, o que deve ser objeto de outras medidas cautelares de natureza real, como o sequestro ou arresto de bens e valores que constituam produto do crime ou proveito auferido com sua prática”, ressaltou.
Ele destacou também que a necessidade da prisão para garantia da investigação ou da instrução criminal visa resguardar os meios do processo, evitando-se a ocultação, alteração ou destruição das fontes de prova e que tal hipótese não foi devidamente fundamentada. Nesse ponto, o relator explicou que o decreto de prisão deveria indicar os elementos fáticos que demonstrassem, concretamente, em que consiste o perigo para o regular desenvolvimento da investigação ou da instrução e a sua vinculação a um comportamento do acusado, não podendo se basear em mera conjectura ou suspeita.
“Na espécie, a decisão do juízo de primeiro grau se lastreia, de modo frágil, na mera conjectura de que o reclamante, em razão de sua condição de ex-ministro e de sua ligação com outros investigados e com a empresa envolvida nas supostas fraudes, poderia interferir na produção da prova, mas não indica um único elemento fático concreto que pudesse amparar essa ilação”, argumentou o relator.
O ministro Dias Toffoli determinou que o juízo federal da 6ª Vara Criminal Especializada em Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional e em Lavagem de Valores da Seção Judiciária de São Paulo “avalie a necessidade, se for o caso, de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, dentre aquelas previstas no artigo 319 (incisos I, II, III, IV, V e IX), e no artigo 321, ambos do Código de Processo Penal”.
Clique aqui para ler a íntegra da decisão do ministro Dias Toffoli.
PR/AD
Powered by WPeMatico