As audiências de custódia completaram um ano de funcionamento em fevereiro de 2016 e, mesmo nesse curto espaço de tempo, já é possível medir avanços significativos e projetar resultados otimistas no tratamento da questão penal e carcerária para as próximas décadas. Essa foi a conclusão do evento realizado nessa segunda-feira (30), na sede da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), para apresentar estudo com o resultado de monitoramento das audiências de custódia na capital paulista, com a presença do presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski.
O estudo “As audiências de custódia na cidade de São Paulo: avanços e desafios” foi organizado pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), representante da sociedade civil associado ao CNJ na implementação do projeto. Pesquisadores do IDDD monitoraram quase 700 audiências de custódia no Fórum Criminal da Barra Funda no ano de 2015, traçando um perfil dos presos em flagrante – negros, pobres, de baixa instrução, réus que praticam crimes de roubo, furto ou tráfico de drogas – e avaliando o funcionamento da metodologia na prática. Encontraram, por exemplo, a baixa presença de advogados nas delegacias durante a prisão em flagrante (5%) e o alto percentual de presos que não sabem do que estão sendo acusados (84%).
Homenageado durante o evento pela implantação do projeto audiências de custódia, o ministro Ricardo Lewandowski lembrou do processo que levou a atual gestão a investir nessa iniciativa e falou sobre os desafios para a consolidação da metodologia, especialmente nos locais mais afastados do país. Para o ministro, a sociedade precisa lembrar que, nos últimos anos, o Estado estava investindo em políticas voltadas ao aumento da punição e do encarceramento, que pioraram a situação carcerária no país.
Segundo o ministro, as audiências de custódia buscam atacar as causas das mazelas do sistema prisional ao oferecer novos instrumentos capazes de gerar uma nova mentalidade. “Estamos convencidos de que não desfrutaremos no país de uma sensação de paz social enquanto não fizermos da dignidade e do respeito a todas as pessoas indistintamente, fora ou dentro dos presídios, uma forma de convívio habitual de todos os brasileiros. Demos um pequeno, porém importante passo na nossa esfera de competência, e oxalá em breve poderemos contribuir para desanuviar o povo do clima de ódio e de intolerância que vivemos nesta quadra histórica não só no Brasil, mas em todo o mundo”, afirmou Lewandowski.
Para o presidente do IDDD, Augusto Botelho, o fato de 39% dos casos analisados serem convertidos em liberdade provisória não indica que o Judiciário está soltando pessoas perigosas aleatoriamente, mas sim evitando prisões desnecessárias. Para ele, o ponto mais positivo das audiências de custódia é modificar a cultura de que só o encarceramento resolve. “Se olharmos no futuro o índice de reincidência dessas pessoas, vamos mostrar cientificamente que só cadeia não funciona. Tenho certeza de que a reincidência vai ser muito menor”, disse.
Quanto às adaptações necessárias, o presidente do IDDD lembrou da atenção diferenciada que deve ser dada às mulheres, especialmente quando grávidas ou com filhos, o incentivo a tornar a linguagem jurídica mais acessível, a remoção das algemas como regra e a apuração dos casos de maus tratos e tortura. Ele também reforçou o posicionamento para que as audiências sejam realizadas em 24 horas e nunca por videoconferência.
Presidente da AASP, Leonardo Sica lembrou que o Brasil é o único entre os países que mais encarceram no mundo com tendência de aumento dessa população nos próximos anos, caminhando para 1 milhão de presos. Para ele, as audiências de custódia são a política mais eficaz de enfrentamento dessa realidade surgida nas últimas décadas. “As audiências de custódia servem para caminhar mais próximo da civilização e mais longe da barbárie. Independentemente do tratado normativo, há a questão humana”, disse. O advogado ainda avaliou que as audiências de custódia fortalecem o papel do magistrado e do Judiciário. “A melhor forma de fazer valer uma decisão é conhecer aquele cidadão que ele vai prender”, completou.
Fonte: CNJ
Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ
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