Pedido de vista da ministra Cármen Lúcia suspendeu, nesta terça-feira (5), o julgamento do Inquérito (INQ) 3711 pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). A denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) imputa ao deputado federal Nilson Aparecido Leitão (PSDB-MT) a prática dos crimes de corrupção passiva, tentativa de peculato e fraude em licitação, quando o investigado ocupava o cargo de prefeito do Município de Sinop (MT).
Em outubro do ano passado, o relator determinou o desmembramento do caso e o envio da investigação em relação ao demais envolvidos à Justiça Federal em Sinop. No STF, permaneceu apenas a investigação contra o deputado federal, em razão do foro por prerrogativa de função.
Denúncia
Consta da denúncia que o então prefeito teria recebido vantagem indevida para praticar ato de ofício consistente na contratação de obra de engenharia civil mediante direcionamento em favor da empresa de Zuleido Veras, sócio da construtora Gautama. A denúncia aponta ainda que teria havido superfaturamento na obra, que consistia na construção da rede de esgoto da cidade.
De acordo com o Ministério Público, as provas produzidas no curso da investigação são substanciais para a comprovação da existência, autoria e materialidade dos crimes. Por intermédio de interceptações telefônicas, foram captados diálogos que comprovariam a liberação dos recursos para a empreiteira Gautama muito tempo antes da licitação e a entrega de dinheiro ao prefeito. Além disso, laudo do Tribunal de Contas da União (TCU) comprovaria, para o MPF, que efetivamente houve a fraude na licitação. “Não há como acolher a alegação de inépcia. Quem lê a denúncia tem a exata noção de todo o contexto fático que deu causa à acusação”, disse a subprocuradora-geral da República Cláudia Sampaio Marques na sessão de hoje.
A defesa do deputado federal sustenta que a denúncia não deve ser recebida diante da insuficiência das provas produzidas. O resultado da licitação, afirma a defesa, foi divulgado muito antes da conversa em que o Ministério Público entende que a Gautama já tinha ciência de que ganharia o certame. A concorrência, segundo os advogados, foi validamente vencida pelo consórcio que apresentou a melhor proposta. Além disso, para a defesa, não ficou comprovado, no conteúdo das escutas telefônicas, o recebimento de qualquer vantagem indevida pelo ex-prefeito.
Por fim, a defesa de Nilson Leitão afirmou que, em 8 de março de 2016, a Segunda Turma do STF reconheceu que as escutas derivadas da operação Navalha, como no caso dos autos, “se contaminaram” diante de indícios de envolvimento de autoridades com foro por prerrogativa de função (ministros do Tribunal de Contas da União) nos fatos investigados. Na ocasião, de acordo com a defesa, a ministra Cármen Lúcia, relatora do INQ 3732, salientou que esse fato deveria ter ocasionado a transferência da jurisdição para o STF e votou pela declaração da nulidade das interceptações telefônicas realizadas por juiz a quem não caberia analisar a causa e pela invalidação de todas as provas decorrentes dessas interceptações. Diante desses fatos, a defesa pede a rejeição da denúncia.
Voto do relator
O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, afirmou inicialmente que o crime previsto no artigo 90 da Lei 8.666/1993 (Lei de Licitações) prevê pena máxima de quatro anos e, na hipótese, o prazo prescricional é de oito anos. Como o certame licitatório ocorreu em abril de 2006, ele reconheceu em seu voto a ocorrência da prescrição quanto a esse delito. No entanto, explicou que a análise do fato é importante para contextualizar as demais imputações.
Mendes afirmou não haver provas da ocorrência de direcionamento a afastar o caráter competitivo do certame. “Há fragilidade na demonstração do direcionamento da licitação e também do sobrepreço”. Além disso, para o ministro, não há indicativos de que o então prefeito tenha participado da elaboração do edital ou da análise das propostas.
A respeito do suposto recebimento de vantagem indevida – corrupção passiva – por Nilson Leitão em decorrência da fraude na licitação, o relator afirmou que os indicativos são “tênues”. Quanto à imputação do crime de tentativa de peculato, decorrente do pagamento de alegado sobrepreço na obra, o ministro Gilmar Mendes salientou que é “perfeitamente lícito” o pagamento, pela prefeitura, dos serviços contratados e prestados se os outros crimes subjacentes à contratação não ocorreram. “Se não havia conhecimento pelo prefeito de direcionamento da licitação ou de corrupção, restava-lhe pagar”. Segundo o ministro, mesmo que a irregularidade na licitação tivesse ocorrido, pagar seria a conduta adequada se o prefeito dela não tivesse conhecimento.
Assim, o ministro votou pela extinção da punibilidade quanto ao delito previsto na Lei de Licitações, em decorrência da prescrição, e pela rejeição da denúncia quanto às demais acusações, por ausência de justa causa, nos termos do artigo 395, III, do Código de Processo Penal. “Não há suficientes concatenação e indícios para se concluir pela existência de justa causa para o exercício da ação penal”, disse o relator.
A ministra Cármen Lúcia pediu vista do autos após o voto do ministro Teori Zavascki, que seguiu o entendimento do relator.
SP/AD
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